Colaboradores

segunda-feira, 10 de dezembro de 2007

Para que odiar o banco?


A abertura do banco no interior araraquarense é às 11h. Estava lá às 10h56min., cerca de cinco mil pessoas já na fila apenas para entrar, para passar pela nossa maravilhosa porta de detector de metais! Pois bem, respira fundo e espera do lado de fora, quando a fila diminuir, entra. Cinco mil pessoas esperando para entrar e a porta de detector de metais, um pouco mal humorada, decide bloquear a entrada de pelo menos duas mil (sendo mais da metade negras e/ou caboclas). Pois bem, respira fundo, pessoas saem da fila, depositam o seu “metal” e passam. Calma, mais alguns minutos... quinze minutos depois, coragem para encarar a fila. Encaro. Entro sem problemas com os meus metais.

Como é a minha primeira vez na agência e ela, como podemos dizer, não está tão bem sinalizada, vou subindo as escadas sem saber qual é o andar dos caixas e sem a menor coragem de encarar uma fila de três mil pessoas para o elevador. Lá vou eu: sobe a escada. Terceiro andar. Acho que não. Desce de novo, olha, melhor. Sim, o segundo andar. Como não é de se estranhar mais duas mil e quinhentas pessoas na fila dos caixas. Pois bem, respira fundo. Encara a fila. Encaro, afinal é só trocar um cheque para pagar meu lindo aluguel. Mais vinte minutos, sendo três ou quatro embaixo da ventilação de três graus abaixo de zero Celsius do ar-condicionado. Pois bem, respira fundo, está chegando. Chegou. Cheque, carteira de trabalho, o protocolo do RG perdido não vale...pois bem, paciência, respira fundo. Olhada, assinatura, assinatura do patrão e da empresa não identificados. Mais dez minutos de espera. Pois bem, respira fundo, paciência, vamos lá, ainda é só segunda–feira. Ok. Tudo certo. Tchau. Muito obrigada. Desculpe a demora. Ai ai... cheque trocado. Alívio e eu pergunto: para que odiar o banco?

Fernanda Pereira

domingo, 9 de dezembro de 2007


Sem nome ou RG

Pela madrugada afora sinto o vento tocar, maltratar e ultrapassar o que me resta de corpo. Pelo dia todo busco luz por entre as nuvens humanas, luz na água, suja ou apagada, de todos os córregos... Córregos imundos de mundo real. Busco alimento para o corpo – a alma não come a anos, greve de fome diante da surdez optativa dos irmãos. Pelos segundos que correm, me devassam e me deixam para trás; passa criança adult-erada apontando os destroços da sua arma ilusória de realidade dolorida, apenas, para quem sente... Passam saltos de madames e grifes que agridem cada dor do cérebro, meu, da junta e desjunta da ceia passada: ratos digeridos à molho cru de lagarta. Olhos civilizados passam curiosos, não os enxergo mais, com o tempo se aprende a deixar invisível o visível que nos atormenta. Passam cães, amigos humanos, dividem seu pêlo, compartilham aquecimento frustrado do dia. Volta à madrugada e a sós espanto quem me rouba o último pedaço de papelão – um cobertor, uma casa, um refúgio, uma riqueza – dói e eu tento pegá-lo de volta, é meu! Tento em vão, como se houvesse propriedade na sociedade periférica do luxo... Nada é meu! Nada é meu nessa praça, nesse bairro, nessa cidade, nesse país, nesse continente, nesse planeta, TUDO é de homens famintos por um pedaço de papelão... Se lhes pareci muito culto não se espantem eu vim do mesmo inferno de civilização que vocês...


Fernanda Oliveira