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sábado, 26 de janeiro de 2013

um buraco na visão


Num tempo presente, há uma menina feita e refeita de retalhos, costurados a cada descortinar dos entendimentos que lhes foram enfiados na garganta. E assim, tudo o que seu corpo comia, os pensamentos também ingeriam e a pele se fazia de mentiras.
Ela espiava um buraco, por ele enxergava coisas que não queria ver. Eram ideias que as rasgavam inteira. Tudo que ela era em um instante não era mais. Tudo que acreditava acreditar se desprendia da pele.
Todos os dias, ia pelo mesmo caminho. Passava por pedras, encruzilhadas e armadilhas. Uma trajetória carregada de angústias, escuridão e dor.

Mas esse caminho não era apenas dela, envolvia a tudo e a todos que conhecia.
O colo de seu melhor amigo, que foi um cachorro fiel.
O cachorro quente compartilhado com os melhores amigos.

A morte e a vida se mostravam em apenas uma tarde. E o buraco que espiava crescia
sem precedentes, nem controle. Ao associar o cachorro amigo com o cachorro quente, tudo que parecia ter sentido se dissolvia e embriagava os pensamentos.

Quando tinha coragem de espiar novamente, não era apenas essas duas palavras (amigo/quente) que se embaralhavam.

No caminho de encruzilhadas e armadilhas, via a vida presa e morta por pessoas vivas. E assim, aquele desenho lindo da infância que era preenchido por animais felizes, todos que aprendera na escolinha. Vaquinhas, cavalinhos, galinhas, pintinhos, passarinhos, peixinhos. Toda a fofura diminutiva se voltava contra ela mesma. O desenho colorido se fez de uma única cor, a da escravidão.

E toda a alegria e leveza da alma, a acusavam de ser a responsável por essa única cor nos desenhos vivos, os que aconteciam por trás daquele buraco.
Ela não estava sozinha, muitos vinham com ela desfrutar da sensação de prazer do cachorro quente. Sensação de prazer que de súbito se fazia sensação de angústia.

Foi assim que o líquido branco tão querido pela família lhe parecia sangue e não mais leite. Foi assim que a fartura do queijo escorrendo no lanche deixou de ser alegria e passou a ser ofensa. Foi assim que o bife, o filé de frango, o cação, os ovos, dentre outros, deixaram de ser alimento e tornaram-se desrespeito.
A menina feita e refeita de retalhos, agora descortinados e doloridos lhe apontavam um novo caminho. E ela buscará apenas vida e não mais assassinatos.

O buraco em sua visão expandia-se tanto que agora ele era o olhar todo. Um olhar que busca respeito e vida!


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